Recebi essa mensagem por email e achei uma das mais francas já enviadas durante esse período eleitoral.
Não acho que o poder com o PSDB vai melhorar o Brasil. E não acho que eles foram mais honestos no governo que o PT.
Enfim, não acho que a eleição se dá por conta dos escândalos, ou só votaríamos em quem nunca tivesse estado no poder, porque quem senta na cadeira mágica, faz merdinha.
Mas acho que nesta hora do campeonato, votar nulo é desculpa pra poder falar mal de quem entrar, e não se comprometer. E eu quero me comprometer com o futuro que vou (vamos) ter.
Quem assina é Maurício Abdalla, professor da UFES e educador popular.
(Cortei algumas partes, mas é mais ou menos isso aí..)
- Para quem vai votar nulo
Na universidade em que leciono há pichações em vários locais com os seguintes dizeres: "nossos sonhos não cabem na urna: vote nulo!". A frase tem efeito e, por isso, pode ser convincente. Principalmente porque todos nós, da esquerda, concordamos com a premissa de que nossa utopia e nossos sonhos jamais se realizarão apenas através de eleições. (...)
A frase da pichação tem tido atualmente uma variação: nossos sonhos não cabem em Serra ou em Dilma: vote nulo! O sentido da frase é o mesmo. Mas contém a mesma falácia, ou seja, é um argumento que parece verdadeiro, mas não é. Se tenho que rejeitar tudo aquilo no qual meus sonhos não cabem, tornar-se-iam verdadeiras todas as variações do argumento. Vejam bem: nossos sonhos não cabem em um prato de comida: não comam! Nossos sonhos não cabem em um curso superior: não freqüentem a universidade! Nossos sonhos não cabem em um ônibus: andemos a pé! Etc. (...)
O que precisamos refletir, neste momento, é que votar não é fazer a revolução, tanto quanto não é impedi-la de um dia acontecer. A opção que farei nas urnas não afetará minhas convicções de esquerda e nem minha utopia revolucionária. Não estamos decidindo sobre o capitalismo ou o socialismo, mas tão somente em quem vai ocupar o poder nos próximos 4 anos. E, independente de minha decisão de votar ou não, alguém vai ocupá-lo – no caso presente será ou Dilma ou Serra.
É evidente que, dependendo das forças que ocupam o poder, o processo de transformação social pode avançar ou retroceder. A vida das pessoas pode melhorar ou piorar. A relação com outros países pode ser de subserviência ou de autodeterminação. E é aí que a nossa decisão deve se pautar. (...)
Quem é de esquerda deve ter críticas profundas ao Governo Lula. Sabemos quais são, não precisamos insistir nelas. Mas sabemos também que nenhuma de nossas críticas se assemelha às da extrema-direita. Ou seja, não somos aliados do PSDB e do DEM na oposição ao Governo Lula. (...)
Programas que investiram no combate à pobreza extrema são polêmicos, pois podem ser chamados de assistencialistas ou até, para os mais exaltados, como uma espécie de “anestesia que impede o desabrochar do espírito de revolta que favorece a atitude revolucionária”. Caros companheiros, a fome (cuja experiência desconhecemos) não causa revolução. Causa dor, desespero, submissão e a fuga para atividades fora da legalidade. Caso contrário, os grupos de esquerda seriam mais fortes que o narcotráfico, que a economia informal e que a criminalidade.
Além disso, eu que me alimento todos os dias, não quero fazer discurso para os que não comem, não quero dialogar com estômagos em desespero, mas sim com a consciência de cidadãos que, uma vez alimentados, podem sonhar com uma sociedade sem exploradores e explorados. E se o capital não os alimenta, o Estado deve fazê-lo. (...)
Por esses motivos e por muitos outros, não podemos dizer que o país ficará igual com Dilma ou com Serra. Nem que os movimentos sociais serão indiferentes a um governo ou ao outro. Portanto, uma coisa é demarcar posicionamentos ideológicos, reafirmar nossas mais profundas convicções revolucionárias, combater o capitalismo com todas as forças e sem capitulação, trabalhar a mobilização popular e lutar pelo socialismo. Outra coisa é apertar dois dígitos em uma urna para escolher o presidente quando só se tem duas opções. São tipos de ações diferentes, não excludentes, mas, de certa forma, relacionadas. (…)
Não quero ter sob minhas costas o peso da omissão, caso Serra e as elites mais atrasadas venham a ocupar o Palácio do Planalto, perseguindo os movimentos sociais, virando as costas para os países periféricos, jogando o peso das crises financeiras nas costas do mais pobres e abandonando os miseráveis a seu próprio destino.
Por isso, voto em Dilma, sem alterar em nada minhas utopias e sem comprometer o meu espírito crítico e meu sonho de um futuro socialista.
PT, saudações.
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Não vou me adaptar
Dia 31 eu viajo novamente pra votar. Meu voto não será no político que mais se aproxima da minha realidade. Se fosse assim, não votava em ninguém. Meu voto é pra tentar mudar essa realidade escrota que a gente vive, onde não temos liberdade.
Falta liberdade para beijar na boca do seu amor no meio da rua, porque ele tem o mesmo sexo que o seu. Falta liberdade para usar a roupa que você gosta, porque podem te chamar de piranha e te agredir. Falta liberdade para ter o celular que eu quero, porque podem me assaltar. Canso de ouvir meus amigos dizendo que tem um celular “lesco-lesco”, porque “vai que sou assaltado...”. Como assim, em que mundo a gente vive? Eu não posso ter o que eu quero?
Viver sempre alerta é viver com medo. O medo que nos impede de andar a pé durante a noite, passar numa rua escura, sentar num banco sozinha no ônibus e ouvir mp3. Medo que não me deixa morar num apartamento maior num lugar mais afastado, me faz gastar com taxi para voltar pra casa, pagar um condomínio caro para ter segurança 24h e pagar um aluguel nas alturas para morar na zona sul.
Eu sempre lutei contra esse medo, mas na quarta-feira fui surpreendida. Em dois segundos e destração e desvaneio, um pivete mequetrefe arrancou o cordão do meu pescoço – cordão da minha mãe, presente de 25 anos de casamento, que tinha levado pra limpar na segunda-feira. Depois da pausa nostálgica e pequeno-burguesa, me atento aos fatos: Por que passei por ali? Por que não peguei um ônibus como tinha pensado em fazer? Por que não corri atrás do infeliz?
Passado o susto e a raiva (e a vontade de ver o pivete sendo atropelado na próxima esquina, com meu cordão na mão), só consigo ter pena. Pena dele, que vive uma vida miserável onde sobrevive roubando o que nunca conseguirá ter, pena de mim, que preciso passar por uma situação tão ruim e me esconder da rua com medo, e pena do nosso país, que produz a cada dia mais pessoas que precisam roubar pra viver.
Então, dia 31 eu viajo novamente para votar. Mas não voto por mim. Meu voto é pensando na pessoa que me assaltou. Para que ele nunca mais precise roubar para sobreviver. Que seus filhos possam ir para a escola e dizer com orgulho que seu pai tem uma profissão. Para que ele não precise usar crack para fugir da vida miserável que possui.
Desejo à ele muita luz na hora de escolher seu governante. Que ele escolha alguém com uma política decente, que possa mudar a sua vida. É por isso que estudo e me interesso por políticas públicas sociais, para que nossa realidade, a minha e a dele, mude. Para melhor. Porque eu não vou, e nem quero, me adaptar.
Falta liberdade para beijar na boca do seu amor no meio da rua, porque ele tem o mesmo sexo que o seu. Falta liberdade para usar a roupa que você gosta, porque podem te chamar de piranha e te agredir. Falta liberdade para ter o celular que eu quero, porque podem me assaltar. Canso de ouvir meus amigos dizendo que tem um celular “lesco-lesco”, porque “vai que sou assaltado...”. Como assim, em que mundo a gente vive? Eu não posso ter o que eu quero?
Viver sempre alerta é viver com medo. O medo que nos impede de andar a pé durante a noite, passar numa rua escura, sentar num banco sozinha no ônibus e ouvir mp3. Medo que não me deixa morar num apartamento maior num lugar mais afastado, me faz gastar com taxi para voltar pra casa, pagar um condomínio caro para ter segurança 24h e pagar um aluguel nas alturas para morar na zona sul.
Eu sempre lutei contra esse medo, mas na quarta-feira fui surpreendida. Em dois segundos e destração e desvaneio, um pivete mequetrefe arrancou o cordão do meu pescoço – cordão da minha mãe, presente de 25 anos de casamento, que tinha levado pra limpar na segunda-feira. Depois da pausa nostálgica e pequeno-burguesa, me atento aos fatos: Por que passei por ali? Por que não peguei um ônibus como tinha pensado em fazer? Por que não corri atrás do infeliz?
Passado o susto e a raiva (e a vontade de ver o pivete sendo atropelado na próxima esquina, com meu cordão na mão), só consigo ter pena. Pena dele, que vive uma vida miserável onde sobrevive roubando o que nunca conseguirá ter, pena de mim, que preciso passar por uma situação tão ruim e me esconder da rua com medo, e pena do nosso país, que produz a cada dia mais pessoas que precisam roubar pra viver.
Então, dia 31 eu viajo novamente para votar. Mas não voto por mim. Meu voto é pensando na pessoa que me assaltou. Para que ele nunca mais precise roubar para sobreviver. Que seus filhos possam ir para a escola e dizer com orgulho que seu pai tem uma profissão. Para que ele não precise usar crack para fugir da vida miserável que possui.
Desejo à ele muita luz na hora de escolher seu governante. Que ele escolha alguém com uma política decente, que possa mudar a sua vida. É por isso que estudo e me interesso por políticas públicas sociais, para que nossa realidade, a minha e a dele, mude. Para melhor. Porque eu não vou, e nem quero, me adaptar.
Assinar:
Postagens (Atom)